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Revista

A Paternidade e a Palavra

A paternidade é algo que no cristianismo tem um descortinar completamente especial. Não é à toa que a expressão “Deus é Pai” é tão comum nas sociedades cristianizadas, como a brasileira, pois o conceito de uma relação paterna entre os homens e Deus é algo mais que sedimentado (ainda que mal compreendido por muitos).

Jesus implodiu o distanciamento entre Deus e os homens, chamando o Criador não só de Pater (a designação grega formal para pai, como na oração do Pai Nosso), mas também de Aba, um “papai”, que explicita, na língua aramaica, uma relação íntima e de completa dependência do filhinho com seu pai (Marcos 14.36). Vemos na teologia cristã a paternidade como um pilar, em todos os sentidos. Deus exerce paternidade em sua eterna existência na Trindade. Ele explicita este relacionamento ao enviar o Filho como nosso Salvador. Não bastasse isto, Ele, através da redenção em Jesus Cristo, amplia Sua família com a adoção de filhos (Romanos 8.15). Em tudo vemos o relacionamento de Deus com o homem redimido sob a ótica desta paternidade.
Para alguns, isto pode parecer ofensivo ou assustador. Ofensivo para aqueles que, vacinados com uma ênfase muitas vezes machista do papel masculino, querem eliminar a caracterização do papel paternal e maternal na família. Assustador para os que, traumatizados com a figura de seu próprio pai, se aproximam com reservas do Deus Pai, com medo de receber o mesmo tratamento que receberam em casa. Mas o Pai demonstrado na Palavra de Deus é nada menos que perfeito. Ele ama perfeitamente. Ele cuida perfeitamente. Ele protege perfeitamente. Ele nutre perfeitamente. Não se aproximar dEle é abrir mão de tamanho cuidado e amor.
O conceito de família, entretanto, não é algo que nasceu das relações humanas e sociais. A família foi algo planejado por Deus, tendo como fonte a própria existência eterna do Deus Triuno. “Nós amamos porque Ele nos amou primeiro” (1 João 4.19). E se nosso objetivo como filhos é o de sermos cada vez mais parecidos com nosso irmão mais velho, Jesus (Romanos 8.29), fica claro que o melhor lugar para aprendermos sobre a paternidade é pelo exemplo divino. Se queremos exercer uma paternidade abençoadora, devemos mirar o exemplo recebido do próprio Deus. Da riqueza de tal imagem, extraio alguns exemplos:
Andar na Verdade – A prática da mentira é algo que nosso Senhor desconhece. Jesus foi claro ao afirmar que o pai da mentira é o Diabo (João 8.44), e aquele que anda na mentira se iguala a ele. De forma contrária, nosso Deus é o Deus da verdade. A oração de Jesus foi: “Santifica-os na verdade, a tua palavra é a verdade.” (João 17.17). Nossa cultura silenciosamente valoriza a mentira social, onde dizer uma “mentirinha” para manter as relações sociais é algo para muitos aceitável. Mas nossos filhos absorvem muito mais do que isto se os pedimos para falar ao telefone que não estamos ou se elogiamos alguém pessoalmente e em casa “fatiamos” tal pessoa com comentários maldosos. Filhos que têm uma palavra de valor só crescerão em um ambiente onde a verdade é plenamente vivida.

O que a Bíblia diz sobre a paternidade e/ou o papel do pai na família

Cuidado Espiritual – Muitos poderiam ser os cuidados citados quando pensamos em como Deus olha para os Seus. Ele nutre, protege, cura, motiva etc. Mas há um cuidado que muitos pais negligenciam quando o assunto é seus próprios filhos: o cuidado espiritual. Jesus disse a Pedro que o Diabo quis “peneirar os discípulos como trigo” (Lucas 22.31), mas Deus os protegeu a fé para que não desfalecessem. Pais naturais frequentemente delegam às esposas e à Igreja o crescimento espiritual de seus filhos, abrindo mão de exercer sua autoridade como referência paterna para com os filhos. O filho que não enxerga no pai uma espiritualidade sadia e ativa, provavelmente terá que se esforçar muito para ver em Deus um Pai que se interessa e investe em sua jornada espiritual. Ao delegar a terceiros o crescimento espiritual dos filhos, o pai abre mão de um dos maiores privilégios de sua própria jornada com Deus – a de forjar em seus filhos o discipulado de Cristo.
Caminhada de Santidade – Jesus foi claro com seus discípulos: “Sede vós perfeitos, como é perfeito o vosso Pai celeste” (Mateus 5.48). A perfeição pode parecer algo inatingível para qualquer mortal, mas a busca da santidade deve fazer parte de nosso dia a dia como pais. Muitos de nós tiveram referências paternas completamente desestruturadas, e Deus reverteu tal experiência ao assumir Sua paternidade sobre nossa vida. Muito melhor será a jornada de nossos filhos se buscarmos viver em santidade na presença de Deus e na presença deles. Como disse Paulo a seus filhos espirituais: “Porque a nossa glória é esta: o testemunho da nossa consciência, de que, com santidade e sinceridade de Deus, não com sabedoria humana, mas, na graça divina, temos vivido no mundo e mais especialmente para convosco.” (2 Coríntios 1.12).
Se queremos viver uma paternidade verdadeira, devemos aprender com nosso Deus e Pai como Ele exerceu e exerce em nós Sua paternidade. Nossa vida como pais é um reflexo da paternidade de Deus e, por causa disto, não podemos exercê-la de qualquer maneira, pois isto resulta em um mau reflexo desta maravilhosa realidade espiritual. Em Cristo, Deus nos conclama a um chamado eterno: que vivamos em completa dependência dEle, de forma ativa influenciando nossos filhos para que, através de nós, conheçam o que há de mais sublime em sua existência, o relacionamento com o Pai celeste. Como todo chamado divino, há um preço a ser pago em esforço, tempo e investimento, mas o retorno é, sem dúvida, imensurável, eterno.

 

LUÍS FERNANDO NACIF ROCHA     |   Pastor auxiliar na Oitava Igreja. Engenheiro Eletricista, é casado com Ana Paula e pai de Elias (9) e Estêvão (7)