O FARISEU E O PUBLICANO
LUCAS 18.9-14
Nesses tempos de filmes de super-heróis, Vingadores e Liga da Justiça, estamos bem acostumados com personagens fortes e histórias cativantes. De modo geral, as próprias caras dos atores já revelam para o que vieram. Enquanto o Capitão América é forte, alto e com jeito de galã, os inimigos são mais feios que os ogros das histórias infantis. Já no início do filme, percebe-se para quem se deve torcer.
As parábolas de Jesus, entretanto, não costumavam ser assim tão diretas. Ele era mestre em chocar seus ouvintes com personagens contraditórios e heróis improváveis. O homem bom de uma história era o samaritano, enquanto em outra, um juiz iníquo é usado para retratar as respostas de oração a Deus.
Na parábola do Fariseu e do Publicano, Jesus abre a história descrevendo um típico religioso dedicado. Ele dá graças a Deus por não ser um pecador, um sinal de grande humildade para o judeu da época. Ele jejua dois dias na semana, algo que só alguém bem piedoso faria. Sem contar o fato de ser dizimista fiel, algo que, de acordo com a Lei de Moisés, o levaria a dedicar até 20% de seus ganhos ao Senhor. Que homem! Que piedade!
O publicano, por sua vez, era um grande pecador. Até mesmo ele reconhecia isso, pois não se atrevia a chegar perto do local onde os demais, incluindo o Fariseu, oravam. Como era o costume judaico, ele também orava em pé, mas não ousava erguer os olhos, como quem evita olhar nos olhos da pessoa de quem se é devedor. O bater no peito? Nada mais justo, pois era uma expressão da época que comunicava a própria miséria, o que só é confirmado por sua declaração: “Eu sou pecador”!
Até aqui, na pintura mental lançada por Jesus, os personagens eram explícitos, sem necessidade de profundas interpretações. O justo Fariseu e o pecador Publicano, mocinho e bandido, herói e vilão, prontos para mais uma bela lição de espiritualidade.
Acontece que, com Jesus, o inesperado era algo quase certo. E numa frase de conclusão, ele inverte os conceitos de espiritualidade, não para deixá-los de cabeça para baixo, mas para colocá-los novamente firmados de pé: “Digo-vos que o Publicano desceu justificado para sua casa, e não o Fariseu; porque todo o que se exalta será humilhado; mas o que se humilha será exaltado”.
Aparências enganam, e, nisso, a vida real é bem mais fértil do que os filmes. Não conhecemos o que se passa na mente e no coração das pessoas. Vemos o comportamento exterior, com suas palavras calculadas e gestos bem pensados. Formamos estereótipos do que deve ser uma boa adoração e esperamos que as pessoas sigam nossas regras. Entretanto, Deus vê o coração, lê a alma. O que para alguns é a constatação da derrota, para Deus é o pontapé inicial da grande vitória.
O Fariseu se comparava aos demais à sua volta. Pior, considerava que todos os homens eram ladrões e adúlteros. Só ele prestava. O que ele fazia era louvável: orações, jejuns e ofertas. Contudo, fazia “de si para si mesmo”. Como um amigo costumava brincar, ele se orgulhava de sua humildade.
O Publicano, que nem no Templo deveria estar, fazia o óbvio, batendo no peito e se declarando pecador. A diferença é que ele não fazia isso para si mesmo nem para aqueles à sua volta. Ele se quebrantava diante do Senhor. E essa, sim, era uma atitude esperada de verdadeira adoração.
Lucas abre a parábola explicando o porquê de Jesus contá-la: alguns confiavam em si mesmos e, considerando-se justos, desprezavam os demais. Um caminho perigoso na espiritualidade é comparar sua vida às pessoas à sua volta. Você sempre encontrará alguém pior, menos honesto e mais pecador que você. Lançar sua medida de justiça a partir de tal plataforma é derrota certa. Por outro lado, quando nos comparamos com Jesus Cristo, a diferença fica gritante. Nossa justiça desaparece e a ideia de que somos os melhores evapora. Diante da perfeição de Cristo, só uma expressão é válida: “Deus, tem misericórdia de mim, que sou pecador” (v. 13).
Pr. Luís Fernando Nacif Rocha
Pastor Auxiliar